Lusofonia ou lusofilia?

Lusofonia ou lusofilia?

Regina Célia Pereira da Silva
Università degli Studi l’Orientale di Napoli

Nos passados dias 23 e 24 de setembro realizou-se, em Lisboa, um simpósio internacional no âmbito das celebrações do Ano Portugal-Brasil/Brasil-Portugal que reuniu vários investigadores e especialistas da lusofonia: académicos, estudiosos, escritores, tradutores e artistas provenientes da Europa, África e América. Este encontro, foi organizado pela Universidade ILusófona – Instituto de Línguas da Universidade Lusófona e Conselho Superior Académico do Grupo Lusófona de Lisboa.

A complexidade das temáticas abordadas contribuiu, sem dúvida, para uma profunda reflexão sobre o conceito de lusofonia, visto que, falar hoje de Lusofonia significa escancarar uma janela sobre o mundo, por vezes desconhecido. De facto, é necessário libertar a mente de preconceitos, ideias e noções preestabelecidas e confecionadas de modo a penetrar de forma completa e transparente no ‘outro’ para poder penetrar no estudo profundo de tal conceito. Além disso, lusofonia é sinónimo de multidisciplinaridade, campo de pesquisa que pretende conquistar um lugar e visibilidade na vida e estudos linguísticos, históricos, antropológicos e socio-culturais contemporâneos. Trata-se de uma questão transversal a todos os países onde a presença lusa se fez e faz sentir, (positiva ou negativamente).

A palavra lusofonia, começou por ser relacionada com a língua ou com o espaço onde se falava ou fala português. Tal conceito, no entanto, não pode ser destacado daquela carga messiânica de que se encontra impregnado e que, de certa forma, ajuda os portugueses a sentirem-se cidadãos do mundo. A lusofonia resulta da expansão portuguesa e, de tudo o que ela implicou, no mundo, por isso, aparentemente garante um futuro, róseo ou não, aos portugueses. Neste sentido, os novos estudos procuram esclarecer e dissimular os factos do passado sem eliminar absolutamente os traços deixados nos séculos.

Este ano realizamos um Clube de Leitura Latino-americano e Portoghese, na Biblioteca Nazionale di Napoli cuja finalidade era exactamente “Ler Lusófilo”. Estes encontros mensais, iniciaram com a leitura de um autor lusitano – José Saramago, passando por um angolano – José Eduardo Agualusa e um brasileiro – Jorge Amado, enriquecendo a bagagem cultural de todos aqueles que participaram.

Após a minha recente participação no colóquio de estudo ‘Pós-lusofonia: línguas, literaturas e identidades’, é impossível não recordar aqui uma interessante conversação tida com o jornalista e escritor Pedro Rosa Mendes, em Nápoles. Falava-se sobre a questão da presença dos portugueses em países orientais, mas onde a colonização e o império não se implataram ou simplesmente não existiram (é o caso do Japão, Vietname, Camboja, entre outros). Apesar disso, a influência da cultura, língua e mentalidade lusitanas é evidente ainda hoje e pode ser identificada, deixando traços nas culturas locais. È neste sentido, que pensamos que o conceito de lusofonia poderá dar lugar ao de lusofilia, isto é, tudo aquilo que - diz; lembra; é; se refere; identifica; é raiz - do sistema socio-cultural português (país de partida) e faz parte dos sistemas culturais ou linguísticos dos países de chegada. Sementes de portugalidade positivas ou não. Cripto-lusophilias!

Estas, são apenas algumas linhas de reflexão que abrem um amplo horizonte de discussão e que alargam a curiosidade dos leitores e as fronteiras da investigação científica no âmbito dos estudos portugueses e lusofónos.


Esta reflexão fez nascer em mim o seguinte poema:



Cripto-lusophilias


Alma generosa
desabrocha colorida
do profundo de uma rosa
e procura incansável, alegria.

Parte numa caravela
num oceano desconhecido e agitado
apesar do nevoeiro, ela
entrevê terra. O lugar sonhado.

Ancorada a nau
desembarca e entra em relação
enriquece-se. Senta-se num calhau
e deixa-se deslizar por entre a multidão.

Rostos diferentes! Observa.
Cores garridas, vestidos originais.
Idiomas variados, objectos tradicionais...
Lindo de morrer. Cultura nova.

Passam horas, dias, anos. Vida.
Dar, conceder, deixar, perder
alma vazia, completamente absorvida
débil, oca sente que vai desaparecer.

Estende-se o mar
para além ds fronteiras
une sem conformar
as diversas culturas.

Renasce a alma na multicultura
nem tétum, quimbundo, guarani, tupi ou lusitano
nem sequer crioulo, goês, malaio, javanês ou indonesiano.
Alma lusa ou lusophilia pura?




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